Wednesday, June 25, 2025

Subir o Rinjani: o que ninguém nos contou

 Com toda a comoção recente em torno da morte da jovem que fazia trilha no Monte Rinjani, na Indonésia, senti a necessidade de escrever sobre a minha própria experiência. Fiz esse trilho há alguns anos, e percebo agora o quão pouco se fala sobre o que realmente significa encarar essa montanha. Poucos sabem o que é, de facto, o Rinjani.

O Monte Rinjani tem mais de 3.700 metros de altitude. A caminhada começa por volta dos 1.000 metros e vai ganhando terreno de forma quase cruel. Comprámos o trilho enquanto estávamos hospedados numa das pequenas ilhas das Fiji — e ninguém nos alertou para o que realmente nos esperava. Disseram apenas que era um trilho de 3 dias e 2 noites, com dormidas em tendas. Nada mais. Nenhuma palavra sobre os perigos, o desgaste físico, ou o que deveríamos levar.

Na véspera de começarmos a subida, começámos a pesquisar online e deparámo-nos com algo inquietante: relatos de pessoas que morreram a tentar fazer o mesmo percurso. Um frio percorreu-me a espinha. A partir daí, comecei a perceber o que era o Rinjani. Não é uma simples caminhada. É quase uma escalada, com troços extremamente íngremes e precipícios ao lado. E nós ali, com pouca preparação.

Faltou informação desde o início. Ninguém nos explicou o grau de dificuldade. Ninguém mencionou o tipo de calçado adequado ou a escassez de comida e água. Acabámos por alugar umas botas de escalada de última hora — e ainda bem que o fizemos.

O primeiro dia foi brutal. Estavam cerca de 40 °C quando começámos a subir. Eu, que não lido bem com o calor, comecei a sentir-me mal logo nos primeiros dois quilómetros. A água que levávamos parecia evaporar-se do corpo. Bebíamos com a consciência de que precisávamos racionar — não sabíamos quando encontraríamos uma cascata ou fonte para reabastecer.

E a subida continuava. Sempre a subir. O corpo pedia pausa, mas o guia repetia que tínhamos de continuar até chegar aos 3.500 metros, onde havia uma pequena área plana para acampar. Ele foi claro: se não chegássemos lá enquanto houvesse luz do dia, correríamos o risco real de cair num dos precipícios.

A força que me restava era pouca. Sentia-me fraca, exausta. Mas fomos. Um passo de cada vez. Até que, finalmente, chegámos ao acampamento. A tempo de ainda aproveitar os últimos minutos de luz solar, complementados por pequenas lanternas que levávamos. Não havia rede, sinal nenhum, nem uma ligação com o mundo exterior. Só o silêncio da montanha e o som do nosso cansaço.

Deitei-me no chão porque já não aguentava mais a dor nas pernas e o aperto no estômago. O jantar foi uma "sopa" com um ovo cozido dentro e uma panqueca de banana. O meu estômago rejeitava a comida. Quase vomitei. Era como se o corpo dissesse: “não me peças mais nada hoje”.

Éramos uns nove na equipa. O guia avisou que deveríamos levantar-nos em breve para subir os últimos 200 metros até ao cume e ver o pôr do sol lá do alto, antes de voltar ao acampamento. Recusei. Simplesmente não conseguia. Sentia-me vazia de forças. Ficámos apenas eu e o meu companheiro no acampamento. Todos os outros seguiram para o cume.

Na manhã seguinte, acordámos cedo. E mesmo sem ter ido ao topo, tive direito a um espetáculo: vi o sol nascer a 3.500 metros de altitude, por entre aquele mar de montanhas. Foi mágico. Uma daquelas imagens que se cravam na memória para sempre.

Por volta das 9h, os outros começaram a regressar. Faltavam duas holandesas. Chegaram cerca de meia hora depois, com expressões de exaustão estampadas no rosto. Perguntei-lhes se tinha valido a pena, e uma delas, visivelmente irritada, respondeu:

— Fomos de sapatilhas, escorregámos várias vezes. Pensámos mesmo que íamos cair e morrer. Pedi ao guia para nos esperar, mas ninguém esperou. Podíamos ter caído ali mesmo e eles nem iam saber. Esta caminhada não é para se fazer de sapatilhas. Ninguém nos avisou que devíamos trazer botas.

Aquilo ficou-me gravado. Era exatamente o que eu já tinha pensado. A falta de preparação e informação podia ter custado caro a alguém.

Seguimos então para o segundo dia. Este era diferente: já não era subir, subir, subir. Agora era descer, descer, descer — a cratera do vulcão. Os joelhos reclamavam, o corpo protestava, mas a paisagem compensava tudo. Era como estar noutro planeta.

Toda a caminhada valeu a pena pelas paisagens deslumbrantes. É algo único, quase místico. Mas há algo importante que nunca se deve esquecer: uma vez que começas, não podes desistir. Não há como voltar para trás. Não há pausas à vontade. Não se pode beber água sempre que se quer. É necessário estar preparado — física e psicologicamente.

O Rinjani não é só uma montanha. É um teste. E merece respeito.